terça-feira, 19 de maio de 2009

Masculino e Feminino

ANTROPOLOGIA TEOLÓGICA DO MASCULINO E DO FEMININO.
1. O igualitarismo em relação ao masculino e feminino.
Em nossa época é difícil, por causa da mentalidade reinante, condicionada pela concorrência capitalista, conceber que possa haver diferentes sem um ser superior ao outro. Surge assim uma tendência muito forte ao igualitarismo, que fecha os olhos das pessoas para as diferenças naturais entre seres diferentes. Esta tendência atual chega a colocar as pessoas humanas no mesmo nível – às vezes inferior – dos animais. Assim também a nossa época é fechada a aceitar diferenças legítimas entre o varão e a mulher. Essa perda de percepção leva a masculinizar a mulher e afeminar o homem, perdendo de vista suas características naturais e acusando todos os que percebem tais diferenças de preconceituosos. De fato, quem vê melhor a realidade tem conceitos que são anteriores à expressão, ou seja, pré-conceitos. Quem não pensa não tem pré-conceitos, aliás, não tem conceito nenhum sobre nada, vive sem razões e sem sabedoria e aceita tudo o que a mentalidade reinante lhe apregoa, numa acomodação covarde. A felicidade da humanidade exige que se conheça melhor a pessoa humana e cada pessoa humana se aceite na sua característica particular, sem uma permanente disputa e comparação com o diferente. Varão é varão, mulher é mulher e a libertação de ambos não estará jamais numa perda de suas características naturais para se assemelhar ao outro. Varão e mulher não devem concorrer um contra o outro, mas complementar-se, e nessa complementação harmônica, na aceitação de suas características em ação de graças ao Criador que os criou tais como são, está sua felicidade.
2. O elemento cultural
Um elemento que entra sempre quando se quer definir as características naturais de varão e mulher é o elemento cultural. De fato, este elemento condiciona a pesquisa das características do varão e da mulher. Esta é muito marcada pela experiência cultural à qual a pessoa está acostumada, que dá determinadas atribuições ao varão e outras atribuições à mulher. Em vez de características naturais cai-se em características culturais, que podem mudar de um lugar para outro, de uma tradição cultural para outra. Este elemento leva a considerar todas as distinções entre varão e mulher como relativas a uma determinada cultura e a considerar as diferenças como relativas, caindo-se de novo no igualitarismo, não reconhecendo nenhuma diferença real, que transcenda as tradições culturais. Nesse caso, não se pergunta por que todas as culturas criam papéis sociais diferentes para mulheres e varões. Se todas as culturas criam papéis sociais e costumes diferentes para varão e mulher, não será porque há uma diferença real entre essas duas realizações da pessoa humana?
3. A “libertação” da mulher e o progresso tecnológico
A nossa época orgulha-se da “libertação” feminina, mas ressente-se de uma forte carência afetiva das pessoas nos ambientes sociais em que a mulher foi “liberada”. Essa liberação da mulher é identificada com a entrada da mulher no mercado de trabalho, em papéis sociais que antes estavam reservados ao varão. Há então hoje corpos femininos nas Forças Armadas, futebol feminino profissional, mulheres na política, no governo, empresárias, taxistas, motoristas de ônibus, halterofilistas etc. Pensa-se que a mulher é liberada se lhe é reconhecido ocupar os lugares em que antes o varão era exclusivo. Isto é hoje possível porque a humanidade passou a dominar muitas fontes de energia que antes não estavam sob o seu poder. A vida nas cidades humanas ficou mais fácil, exigindo sempre menores esforços do corpo humano. Há apenas trezentos anos não tínhamos eletricidade, nem motores de combustão interna de combustíveis fósseis, nem energia nuclear, nem eletrônica analógica nem digital, os exércitos usavam muito menos a pólvora e a esgrima exigia pesadas espadas. A não ser por alguns moinhos movidos a energia dos rios ou dos ventos, a quase totalidade da energia que movia o mundo era animal ou do corpo humano. Não havia estradas pavimentadas, nem outros frutos do petróleo. A mulher, com sua compleição física mais frágil não era adaptada aos esforços necessários e por isso era afastada de funções abertas ao varão. Hoje não faz diferença ser varão ou mulher para dirigir um avião, mas antigamente era necessária força física para conduzir uma diligência por estradas esburacadas. Sem dúvida, o progresso técnico condicionou a “libertação” da mulher. E isto é também um elemento cultural, que pode ser mudado quando tais energias não estiverem mais disponíveis para as pessoas.
4. A diferença fundamental entre varão e mulher
Então que característica pode-se perceber no varão e na mulher que não seja condicionada por nenhuma cultura? O primeiro elemento à nossa disposição para responder a tal questão é o corpo físico da pessoa. Então devemos ter um elemento intelectual que ligue o corpo à pessoa. Como o corpo pode falar da realidade da pessoa? Assumiremos o caráter sacramental do corpo em relação à pessoa. A pessoa é mais do que o seu corpo. O corpo, porém, é o sinal visível da pessoa, é o “sacramento” da pessoa. Então, um sinal no corpo, será entendido por nós como uma característica da pessoa não só no corpo, mas também no seu psiquismo, no elemento espiritual da pessoa que transcende o corpo. Pode-se chamá-lo “alma”.
Observando o corpo do varão e da mulher, o elemento que os distingue é a característica do corpo da mulher todo condicionado para gerar uma nova vida. Útero, vagina, ovários e seios para amamentar a criança nascida. O varão, não os possuindo, tem o escroto com os testículos, que fabricam o sêmen, e o pênis, perfeitamente adaptado à vagina da mulher. Este elemento é humano e universal e supera todo condicionamento cultural. A mulher é fecundada e o varão a fecunda. Esta característica que se percebe fisicamente, assumimos que também seja psíquica. O varão fecunda a mulher fisicamente e esta concebe uma criança, uma nova pessoa humana. O varão, porém, deve fecundar a mulher também no seu aspecto espiritual, admitindo o corpo como um sacramento da pessoa. Essa fecundação se dá pelo exercício do papel do varão no mundo.
Para conhecer melhor esse papel temos que fazer uma análise mais ampla da situação do gênero humano, segundo as categorias de fecundar e ser fecundado. Como pudemos perceber, para nós o que caracteriza o masculino é “fecundar” e o que caracteriza o feminino é “ser fecundado” e gerar frutos.
Abstraindo a diferenciação entre varão em mulher, diante de Deus, o gênero humano fecunda ou é fecundado? Devemos admitir que Deus é Infinito e não pode ser mudado pela pessoa humana. Esta, sim, que recebe d’Ele muitos dons e se realiza com estes dons, especialmente sua graça. E é pelo dom de Deus que a pessoa humana dá frutos. Admitimos então que Deus fecunda a humanidade. Então na relação Deus-Pessoa Humana, Deus tem um papel masculino e a Pessoa Humana tem um papel feminino.
Esta conclusão tem respaldo bíblico. O povo de Israel é tratado no Antigo Testamento como a Esposa (adúltera, por sua adoração aos falsos deuses, baals e astartes) de Iahweh. E no Novo Testamento, a Igreja é a Esposa de Cristo.
Continuando a abstrair a diferenciação entre varão e mulher, em relação à natureza visível, o gênero humano fecunda ou é fecundado? O elemento divino no homem, sua inteligência, faz com que a natureza seja capaz de produzir muitas coisas que sem a inteligência do homem nunca produziria. É verdade que o corpo do homem se alimenta do fruto da terra e seu espírito se alimenta das belezas da natureza também, mas a pessoa humana permanece fundamentalmente a mesma. Quem muda e produz muitos frutos, impossíveis sem a fecundação do espírito humano é a natureza. Então na relação Pessoa Humana-Natureza, a Pessoa Humana tem um papel masculino e a Natureza tem um papel feminino.
Assim, a pessoa humana é feminina em relação a Deus e masculina em relação à natureza. O elemento superior na escala dos seres, de material a espiritual, tem um aspecto masculino e o elemento inferior tem um aspecto feminino. O superior fecunda com seu espírito o inferior.
Na linguagem bíblica o superior é dito “cabeça” e o inferior é dito “corpo”. A “cabeça” é a fonte de vida do “corpo”, fecundando-o com sua potência vital. Assim Jesus Cristo é “cabeça” da Igreja, que é Seu “corpo”. Veremos adiante alguns exemplos sobre isto.
Não queremos dizer que a mulher – feminina – é inferior ao varão – masculino. Nada disso. O postulado que está aqui é a unidade do gênero humano. Nesses raciocínios estamos sempre considerando o gênero humano na sua unidade: feminino em relação a Deus e masculino em relação à natureza.
A diferenciação da pessoa humana em duas realizações, varão – masculino – e mulher – feminino – não estabelece uma hierarquia entre os dois, como se um fosse superior ao outro. É preciso entender que podem ser diferentes sem necessariamente um ser superior ao outro, mas tal diferenciação ser um sinal da semelhança divina (cf. Gn 1,26-27). O varão e a mulher são “pessoa humana” e isto estabelece uma igualdade fundamental entre essas duas realizações da pessoa humana. Mas as diferenciações entre eles fazem parte da imagem divina segundo a qual foram criados e mostram o caráter relacional das Pessoas Divinas e de Deus com suas criaturas.
Vimos o caráter feminino da pessoa humana na relação desta com Deus. E o caráter masculino da pessoa humana na relação desta com a natureza. A relação da pessoa humana com Deus é espiritual. A relação da pessoa humana com a natureza é, em primeiro lugar, material.
Vimos que a pessoa humana é feminina na relação com Deus. Se há duas realizações da pessoa humana, uma masculina e outra feminina, é de se esperar que a relação com Deus é mais desenvolvida na pessoa feminina, na mulher. Ela, por ser feita para ser fecundada é mais aberta ao princípio fecundador. A mulher, por ser na pessoa humana, a imagem da terra, é mais aberta para Deus. É mais espiritual do que o varão.
Vimos que a pessoa humana é masculina em relação à terra, à natureza. Da mesma forma, é de se esperar que a relação com a terra, a natureza e a matéria, é mais desenvolvida na pessoa masculina, no varão. Ele, por ser feito para fecundar é mais aberto àquela realidade que pede para ser fecundada. O varão, por ser na pessoa humana, a imagem de Deus fecundador, é mais aberto para a terra, a natureza e a matéria. É mais materialista do que a mulher.
Aqui temos um elemento presente em outras realidades da natureza: os diferentes se atraem e os iguais se repelem. Assim é com as cargas elétricas e assim é com a natureza humana também. Varão e mulher se atraem e varão e varão se “repelem”, mulher e mulher se “repelem”. A difusão planejada do homossexualismo em nossos dias não poderá negar esse fato. Esse fato se revela também na inclinação da mulher para o espírito e do varão para a matéria. A mulher é imagem da terra, é atraída pelo Espírito, Deus. O varão é imagem de Deus, é atraído pela matéria, pela terra. Assim, se o fato do varão ser imagem de Deus parecer a alguém uma superioridade sobre a mulher, imagem da terra, a sua atração ao material o inferioriza em relação à mulher atraída para Deus. E, se no simbolismo sacramental, há essa diferença entre varão e mulher, na unidade varão e mulher temos a imagem de Deus, participada pelos dois.
5. Explicação da inimizade entre a “mulher” e a serpente.
“14Então o Senhor Deus disse à serpente: ‘Porque fizeste isso, serás maldita entre todos os animais e feras dos campos; andarás de rastos sobre o teu ventre e comerás o pó todos os dias de tua vida. 15Porei ódio entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a dela. Esta te ferirá a cabeça, e tu ferirás o calcanhar.’ 16Disse também à mulher: ‘Multiplicarei os sofrimentos de teu parto; darás à luz com dores, teus desejos te impelirão para o teu marido e tu estarás sob o seu domínio.’ 17E disse em seguida ao homem: “Porque ouviste a voz de tua mulher e comeste do fruto da árvore que eu te havia proibido comer, maldita seja a terra por tua causa. Tirarás dela com trabalhos penosos o teu sustento todos os dias de tua vida’” (Gn 3,14-17).

Deus estabelece um ódio entre a serpente – satanás – e a mulher. Por que entre a serpente e a mulher se tanto o varão como a mulher foram criados por ele e ambos igualmente pecaram? A descendência, no Antigo Testamento é muito mais atribuída ao varão do que à mulher. Nas genealogias bíblicas do Antigo Testamento – a de Mateus 1,1-17 é inovadora nesse sentido – não aparecem nomes de mulheres. Por que só aqui a descendência é atribuída à mulher e não ao varão? Podemos responder que aqui, por “mulher” deve-se entender o gênero humano como um todo na medida em que se coloca como criatura de Deus, dependente totalmente da graça de Deus, fecundado pela graça de Deus. O pecado fora instigado pela sugestão de “ser como Deus”, a sugestão de que Deus seria auto-suficiente e independente de qualquer outro ser – a revelação da Trindade nos revela que o Deus auto-suficiente é Pessoas que se fazem dependentes umas das outras. Ora, o varão, como “imagem de Deus” estaria aqui dentro da sugestão do pecado. Na medida em que a pessoa humana é “mulher” e se deixa fecundar pela graça de Deus, torna-se inimiga do demônio, cuja sugestão é o orgulho e a auto-suficiência. A descendência dos que vivem a Aliança com Deus, ao receber a terra e a liberdade e todos os demais dons somente da graça de Deus, aceitando-se como criaturas totalmente dependentes de Deus é que é inimiga do demônio. No orgulho da confiança em seu próprio engenho, como aparece no relato da Torre de Babel (cf. Gn 11,1-9), a pessoa humana torna-se mais amiga do que inimiga de satanás.
Depois Deus promete multiplicar os sofrimentos do parto da mulher e os sofrimentos do varão para retirar o fruto da terra. Aqui também mulher e varão são símbolos do gênero humano considerado como um todo. Os sofrimentos do parto não podem ter sido inventados por Deus para aumentar ainda mais a miséria da pessoa humana, já decaída pelo pecado. É melhor entender que “o espírito é que dá vida” (cf. Jo 6,63) e a mulher é a que é atraída pelo Espírito. Gerar vida se tornará, após o pecado, uma tarefa penosa para a pessoa humana. Na relação com a terra, para viver do trabalho de suas mãos, como se não dependesse da graça de Deus, o relato coloca Deus dirigindo-se ao varão, aquele que tem afinidade com a matéria, em perfeita consonância com a explicação que expusemos. Aqui também o varão que sofrerá para tirar frutos da terra é o gênero humano como um todo.
Muitos poderão argumentar: isto é cultural, porque à mulher, que pare os filhos é dado o trabalho doméstico e ao varão o trabalho produtivo dos campos. É verdade que a cultura os moldou assim. Mas também se deve perguntar: por que a cultura os moldou assim? Não será por uma característica antropológica que antecede a cultura? Por uma característica intrínseca do varão e da mulher? Respondemos: naturalmente que sim. E a cultura moderna, por que dá à mulher tarefas produtivas? Porque a descoberta do controle e o uso das novas energias, as dos combustíveis fósseis, a elétrica, a solar, a nuclear etc. fez com que a máquina fizesse realizasse o trabalho penoso a que o corpo mais delicado da mulher não era adaptado, antes da possibilidade do uso dessas energias. Até então, o corpo mais robusto do varão levava-o a assumir as tarefas produtivas que exigiam maior vigor físico. Até no físico se manifesta que o varão é mais adaptado á vida na terra e a mulher é mais espiritual. No gerar e amamentar há todo um envolvimento espiritual entre a mulher e sua criança, que molda o espírito desta.
Pode-se também ver-se sinal de cultura machista na constatação de que na história universal aparece muito mais nomes de homens do que de mulheres. Também aqui a nossa explicação da diferença entre varão e mulher nos ajuda. A história é feita com base em documentos e os documentos vêm de fatos que envolvem relações materiais entre as pessoas. Assim são os varões que lidam com os fatos materiais, a dura luta da pessoa humana para sobreviver sobre a terra, as lutas, os exércitos, as guerras, as construções etc. Dado que o varão é imagem de Deus e voltado para a matéria é de se esperar que tenha uma inclinação maior para todas essas atividades. Isso não significa que a mulher participou menos da história universal. Em cada varão está capitalizado o elemento espiritual gerado nele pela relação com as mulheres, sejam mães, educadoras, esposas, filhas etc. Atribui-se a Napoleão Bonaparte o dito de que “por trás de todo grande homem existe uma grande mulher”. Na formação do espírito do varão, que realizou esta e aquela proeza histórica está a influência espiritual e psicológica das mulheres, benéfica ou prejudicial. Assim, as mulheres participaram intensamente da história universal, mas os seus feitos, sendo mais espirituais, nem sempre deixaram documentos que os testemunhassem. Isto é testemunhado pela passagem “teus desejos te impelirão para o teu marido e tu estarás sob o seu domínio” do versículo 16, onde a mulher, na economia da pessoa humana decaída pelo pecado, e lutando contra a morte pelo trabalho, acaba submetida ao varão, na ordem dessa luta. Mas sua índole espiritual, sua inclinação para Deus e sua vocação a ser fecundada pelo amor a atrairá para o varão, imagem de Deus, a Quem a índole espiritual da mulher procura.
6. O “machismo” de São Paulo não precisa ser machista.
Há nas cartas paulinas algumas passagens que são vistas como machistas, desprezando a mulher, e são pouco levadas em conta, tidas como influenciadas pelo ambiente machista onde São Paulo vivia e pregava o cristianismo. Isso pode ser também entendido como certo desprezo por alguns elementos da Palavra de Deus. Este mesmo Apóstolo escreve:

“Toda a Escritura é inspirada por Deus, e útil para ensinar, para repreender, para corrigir e para formar na justiça” (2Tm 3,16).

A nossa explicação da diferença antropológica entre varão e mulher também propõe uma interpretação para essas passagens, que dispensa a acusação de machismo para São Paulo e dá um sentido espiritual a essas passagens.

“3Mas quero que saibais que a cabeça de todo homem é Cristo, a cabeça da mulher é o homem, a cabeça de Cristo é Deus. 4Todo homem que ora ou profetiza com a cabeça coberta falta ao respeito ao seu senhor. 5E toda mulher que ora ou profetiza, não tendo coberta a cabeça, falta ao respeito ao seu senhor, porque é como se estivesse rapada. 6Se uma mulher não se cobre com um véu, então corte o cabelo. Ora, se é vergonhoso para a mulher ter os cabelos cortados ou a cabeça rapada, então que se cubra com um véu. 7Quanto ao homem, não deve cobrir sua cabeça, porque é imagem e esplendor de Deus; a mulher é o reflexo do homem. 8Com efeito, o homem não foi tirado da mulher, mas a mulher do homem; 9nem foi o homem criado para a mulher, mas sim a mulher para o homem. 10Por isso a mulher deve trazer o sinal da submissão sobre sua cabeça, por causa dos anjos. 11Com tudo isso, aos olhos do Senhor, nem o homem existe sem a mulher, nem a mulher sem o homem. 12Pois a mulher foi tirada do homem, porém o homem nasce da mulher, e ambos vêm de Deus. 13Julgai vós mesmos: é decente que uma mulher reze a Deus sem estar coberta com véu? 14A própria natureza não vos ensina que é uma desonra para o homem usar cabelo comprido? 15Ao passo que é glória para a mulher uma longa cabeleira, porque lhe foi dada como um véu” (1Cor 11,3-15).

Aqui, no versículo 3, “a cabeça” é o princípio de vida do corpo, é o elemento fecundante. Jesus Cristo é a cabeça de toda pessoa humana porque por meio d’Ele é dado o Espírito Santo, a graça de Deus, para dar vida a cada pessoa humana. Assim, em relação à humanidade, Jesus Cristo exerce um papel masculino, é o Esposo (cf. Mt 9,15; 25,1-13; Mc 2,19-20; Lc 5,34-35; Jo 3,29; 2Cor 11,2; Ap 21,2). Ele é a Cabeça do Corpo, que é a Igreja (Ef 4,15; Cl 1,18; 2,10.19).
O varão é a “cabeça” da mulher por ser imagem de Deus que fecunda, física e espiritualmente, a mulher, imagem da terra. Mais tarde veremos em que consiste essa fecundação espiritual.
A “cabeça” de Jesus Cristo é Deus, o Pai, porque Jesus Cristo é o Filho, “gerado, não criado” (cf. Credo Niceno-constantinopolitano) e, tendo-se encarnado, recebe do Pai o Espírito Santo, o sêmen da vida divina para dar vida divina ao seu corpo – físico e místico (cf. Mt 3,16-17; Mc 1,9-11; Lc 3,21-22). Em relação ao Pai, o Filho, Jesus Cristo, tem um papel feminino. Por isso, entre as pessoas divinas é só Ele que se encarna e participa da humanidade, que é feminina em relação a Deus.
A questão do véu e dos cabelos, hoje desprezada como um elemento cultural ultrapassado, significa que o varão simboliza o gênero humano como imagem de Deus, e senhor do mundo visível, não tem nenhuma criatura visível acima de si. E a mulher simboliza que o gênero humano enquanto criatura tem acima de si a Deus, simbolizado pela cabeleira e pelo véu, que cobrem, que ficam acima da sua pessoa. Assim o varão simboliza o gênero humano na sua relação com a terra, o mundo visível e a matéria, e a mulher simboliza o gênero humano na sua relação com Deus. Não se pode perder de vista esses simbolismos se queremos entender a antropologia bíblica sobre o masculino e o feminino. “É glória para a mulher ter uma longa cabeleira” (1Cor 11,15) significa que a glória para toda pessoa humana é estar submetido a Deus. A passagem acima ainda mostra como São Paulo evita, contrariamente às interpretações que o acusam de aceitar o machismo, que tem a mulher e o varão no mesmo nível de dignidade (cf. 1Cor 11,11-12).

“31Todos, um após outro, podeis profetizar, para todos aprenderem e serem todos exortados. 32O espírito dos profetas deve estar-lhes submisso, 33porquanto Deus não é Deus de confusão, mas de paz. 34Como em todas as igrejas dos santos, as mulheres estejam caladas nas assembléias: não lhes é permitido falar, mas devem estar submissas, como também ordena a lei. 35Se querem aprender alguma coisa, perguntem-na em casa aos seus maridos, porque é inconveniente para uma mulher falar na assembléia. 36Porventura foi dentre vós que saiu a palavra de Deus? Ou veio ela tão-somente para vós?” (1Cor 14,31-36).

Por que as mulheres devem estar caladas? Também aqui precisamos ver o simbolismo da mulher como imagem da terra e da humanidade na sua relação com Deus. Nas assembléias devem falar os varões, ou seja, Deus, pois o varão é imagem de Deus. Quando São Paulo diz para a mulher não falar significa que o que é anunciado nas assembléias dos cristãos deve vir de Deus e não dos sentimentos carnais ou terrenos, da política dos homens. A humanidade, enquanto feminina nas relações com Deus deve ficar calada e deixar o Esposo Divino falar. Este é o sentido do contexto, que fala de profecia, que é Deus falando pela boca humana. Como está no versículo 36, a Palavra não sai da assembléia, simbolizada pela mulher, mas vem do alto para a humanidade. A humanidade, a assembléia, a Igreja, simbolizada pela mulher deve ouvir o que Deus fala.

“8Quero, pois, que os homens orem em todo lugar, levantando as mãos puras, superando todo ódio e ressentimento. 9Do mesmo modo, quero que as mulheres usem traje honesto, ataviando-se com modéstia e sobriedade. Seus enfeites consistam não em primorosos penteados, ouro, pérolas, vestidos de luxo, 10e sim em boas obras, como convém a mulheres que professam a piedade. 11A mulher ouça a instrução em silêncio, com espírito de submissão. 12Não permito à mulher que ensine nem que se arrogue autoridade sobre o homem, mas permaneça em silêncio. 13Pois o primeiro a ser criado foi Adão, depois Eva. 14E não foi Adão que se deixou iludir, e sim a mulher que, enganada, se tornou culpada de transgressão. 15Contudo, ela poderá salvar-se, cumprindo os deveres de mãe, contanto que permaneça com modéstia na fé, na caridade e na santidade” (1Tm 2,8-15).

Esta passagem também deve ser interpretada segundo os mesmos princípios. A oração do varão, símbolo de todo o gênero humano enquanto imagem de Deus, e vocacionado à vida de comunhão com as Pessoas Divinas e com seus semelhantes, deve ser pura como a relação das Pessoas Divinas, sem movimentos de poder, mas de amor de umas em relação às outras. A mulher, símbolo do gênero humano nas suas relações com Deus, e atraída pelo varão (cf. Gn 3,16), imagem de Deus, de quem o gênero humano tem sede, procura seduzir o varão, sensibilizando seu espírito, com a beleza de seu corpo, penteados, vestes sensuais e adereços. Isto leva a uma relação carnal com o varão. São Paulo aqui, uma vez mais tem a mulher como símbolo de toda a humanidade na sua relação com Deus e como Deus é Espírito, se vai a Ele com boas obras – a caridade, que é a mesma natureza de Deus – e a submissão a Ele, que é a condição de vida do gênero humano, criatura de Deus. A humanidade, representada pela mulher se salva se é mãe, ou seja se recebe a vida de Deus e transmite vida, se reconhece que recebe da graça de Deus e dá de graça (cf. Mt 10,8; Jo 10,10).
7. O relacionamento do varão e da mulher
Hoje em dia pensa-se o relacionamento do varão e da mulher no matrimônio como completamente recíproco. Ambos são considerados totalmente iguais nas necessidades de afeto e apoio e pensa-se que cada um pode e deve buscar no outro o apoio de que necessita. Sabemos também que os casais do tempo atual têm, em média, um relacionamento bastante frágil. A Palavra de Deus diferencia o varão e a mulher, mas a mentalidade moderna, em prejuízo de ambos, insiste em uma paridade completa, fazendo-se cega para as evidentes diferenças que têm o varão, quando assume sua masculinidade, e a mulher, quando assume sua feminilidade. Esses “quando” da frase anterior fazem-se necessários pois as próprias masculinidade e feminilidade já estão desfiguradas no mundo atual e confunde-se masculinidade com machismo e feminilidade com submissão feminina. Segundo a antropologia que pudemos expor, há uma diferença de papéis a ser levada em conta. Cremos que essa diferença, uma vez compreendida, poderá orientar os casais num relacionamento mais sólido e mais de acordo com a natureza humana.
Um casal e uma família são realidades espirituais, de relacionamento de almas, mais do que de corpos. Uma família não é um casal cuja união se apóia na atração física de um pelo outro e que sustenta economicamente os filhos. Esta situação não se mantém por muito tempo e avilta a pessoa humana. Uma família é uma realidade de comunhão espiritual e amor criando unidade de vida e gerando vida espiritual. Ora, se, como vimos, a mulher, e não o varão, é o membro do casal com um ascendente espiritual maior, pois representa a humanidade na sua relação espiritual com Deus, claro está que a mulher-mãe está no centro da estabilidade e do crescimento espiritual da família. Acontece que a mulher vive neste mundo de lutas e inseguranças, e é imagem da terra. Para desenvolver todo o seu potencial espiritual que a leve a dar essa estabilidade e crescimento espiritual á sua família, a mulher precisa ser fecundada. Fecundada fisicamente ela dá à luz os filhos, segundo a parte animal. Gera os corpos dos filhos. Fecundada espiritualmente, ela realiza-se plenamente, e dela brota a vida espiritual do amor familiar. E tanto a fecundação física como a fecundação espiritual da mulher são tarefa do varão, do marido. Ele realiza essa tarefa exercendo plenamente a sua masculinidade. Sendo voltado para a terra deve, mesmo nas dificuldades sociais, transmitir segurança e paz à sua mulher, nunca fazê-la sentir-se ameaçada por seu marido, elevar sua auto-estima, e, em última análise, fazer dela uma mulher bem-amada. Essa realização amorosa fecunda espiritualmente a mulher, dá-lhe segurança psicológica e um grande amor à vida, qualidades que se refletirão nos filhos em segurança e equilíbrio psicológico e espiritual, e no próprio marido, que colhe os frutos que semeou em sua mulher, como Deus colhe os frutos de suas graças nas almas fiéis. Assim, como no dizer do Papa Pio XII, em discurso apresentado a seguir, a mulher é o “sol” da família, o centro espiritual da família. Mas nada pode a mulher se não for fecundada pelo marido no seu espírito e no seu coração. De modo que o papel da mulher é, a princípio mais passivo, como o da terra, que precisa ser semeada, e o do marido é mais ativo. A atividade da mulher se dará em um segundo tempo, após os frutos da iniciativa masculina e dela brotará a felicidade do lar. Em outra imagem, a mulher é como a pólvora que faz explodir a espiritualidade familiar, mas o varão é a espoleta. O melhor presente que um pai pode dar a seus filhos é uma mãe bem-amada, mulher realizada afetiva e espiritualmente.
Uma senhora estava com problemas no seu ambiente profissional. Irritadiça, brigava com todos com muita facilidade, criava conflitos e isso estava perturbando todo aquele setor da firma. Isso foi levado ao conhecimento do pároco da comunidade freqüentada por ela. Este nada falou com a senhora. Buscou conversar com o marido dela, conhecer melhor o relacionamento que os dois mantinham. Aconselhou e orientou o marido a um relacionamento mais sábio com sua esposa. Esta, em pouco tempo, devido à transformação do tratamento recebido de seu marido, sentiu-se bem melhor, mais bem-amada. As irritações profissionais desapareceram e as brigas no ambiente de trabalho não mais se verificaram.
Daí é importantíssima a iniciativa do varão. Foi essa iniciativa que deu origem ao cavalheirismo, mas este caiu de moda há muito tempo. Por isso, o mundo atual exige da mulher que faça uma parte do que cabe ao varão e não lhe dá aquilo a que ela tem direito, sobrecarregando extremamente a mulher. A liberação feminina, na verdade, se transforma em uma escravidão feminina. Só parece libertadora por causa da mentalidade invejosa e de competição, fruto do pecado, que parece promover a mulher ao retirar dela o que o varão devia lhe dar e parecer dar-lhe a força do varão. Se cada um se aceitasse na sua natureza, como Deus fez cada um, perceberíamos que a “libertação” da mulher na verdade a escraviza e sobrecarrega. Esta é uma das causas principais de muita desorientação e fracasso no relacionamento familiar e afetivo dos casais.
A equiparação total do varão e da mulher, a reciprocidade especular que, pensa-se hoje, deva existir entre ambos está sobrecarregando a mulher e sendo uma causa de enorme sofrimento para o mundo inteiro. Varão e mulher são iguais em direitos perante a justiça humana, em dignidade humana, mas muito diferentes em sua espiritualidade e em sua psicologia.

Alocução do Papa Pio XII aos recém-casados em 11 de março de 1942
(segundo a Liturgia das Horas, Comum das Santas, Ofício de Leituras)

A MULHER É O SOL DA FAMÍLIA

A família tem o brilho de um sol que lhe é próprio: a mulher. Ouvi o que dela diz e sente a Sagrada Escritura: “A graça de uma mulher diligente encanta o marido. A mulher santa e honesta é graça inestimável. Como o sol que se levanta nas alturas de Deus, assim a beleza de uma mulher, ornamento da sua casa”.
Sim, a esposa e mãe é o sol da família. É sol pela generosidade e esquecimento de si, pela prontidão constante e pela delicadeza sempre atenta que a faz adivinhar tudo quanto possa tornar agradável a vida do marido e dos filhos. Derrama à sua volta luz e calor da alma. Costuma dizer-se que será feliz um casamento se, ao ser realizado, cada um dos dois está disposto a não procurar a sua própria felicidade mas sim a do outro; todavia, embora este nobre sentimento e propósito seja dever de ambos, constitui principalmente uma virtude da mulher, pelo seu natural afeto materno e pela sua peculiar sabedoria e prudência de coração. Se lhe dão desgostos, oferece contentamento e confiança; se recebe humilhações, inspira dignidade e respeito; tal como o sol que ao raiar alegra a manhã nevoenta, e ao pôr-se tinge as nuvens com seus raios dourados.
A mulher é o sol da família pela limpidez do seu olhar e o calor da sua palavra. Com o seu olhar e a sua palavra penetra suavemente nas almas, vence-as, comove-as, anima-as, conseguindo afasta-la do tumulto das paixões; restitui ao marido a boa disposição e a alegria do convívio familiar, a seguir a longas jornadas de trabalho aturado e muitas vezes esgotante, na oficina ou no campo, ou ainda nas absorventes atividades do comércio e da indústria.
A mulher é o sol da família com a sua sinceridade natural e cândida, a sua simplicidade digna, o seu porte cristão distinto; é o sol da família, com o seu hábito reflexivo e a retidão de espírito, e ainda com a requintada harmonia com que se apresenta, veste e adorna, mostrando-se ao mesmo tempo reservada e afetuosa. Sentimentos delicados, graciosas expressões do rosto, silêncios e sorrisos inocentes, e um condescendente sinal de cabeça, tudo isso lhe dá a graça de uma flor rara mas simples, que, ao desabrochar, se abre para receber e refletir as cores do sol.
Oh! Se compreendêsseis como são profundos os sentimentos de amor e gratidão que desperta e grava no coração do pai e dos filhos uma figura assim de esposa e de mãe!

Um comentário: